Grupos de Afinidade

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GRUPO DE AFINIDADE = UMA GANGUE DE RUA COM ANÁLISE DE CONJUNTURA

As ideias podem criar situações de vida ou morte, mas alguém só pode realmente lutar e morrer por si mesmo e pelas vidas de seus amigos” Chefe Joseph

Na presente luta as formas de organização a se criar devem ser aquelas apropriadas para as novas condições que são o verdadeiro conteúdo de nossos tempos. Estas devem ser formas tenazes o suficiente para resistir à repressão; formas que podem crescer secretamente, aprendendo a se manifestar de uma grande variedade de maneiras, impedindo que seu modo de atuação seja cooptado pela oposição ou simplesmente esmagado. O grupo de afinidade é a semente/gérmen/essência da organização. Ele é a junção de mútua Necessidade ou Desejo: grupos coesos históricos se uniram por necessidade comum de sobrevivência, enquanto sonhavam com a possibilidade de amor. No período pré-revolucionário os grupos de afinidade devem se juntar para criar um projeto de consciência revolucionária e desenvolver formas de lutas particulares. No período revolucionário propriamente dito eles emergirão como quadros armados nos centros de conflito, e no período pós-revolucionário vão sugerir novas formas de vida cotidiana.

Manifestações de massas têm êxito de duas maneiras: elas trazem níveis predominantes de consciência às ruas e tornam visível a quantidade de alienação ativa em nossa sociedade… e às vezes elas transcendem o tema “manifestações” para se tornarem ações de massas. Como manifestações de massas elas não conseguem fazer avançar a natureza e as formas de nossa luta – como ações de massas (contra a polícia ou contra a propriedade) elas começam a definir a direção e a realidade daquilo que nossa luta deve se tornar.

Motins” ou rebeliões são as formas mais elevadas de ação de massas que já vimos até agora. Estas rebeliões projetam a consciência de uma comunidade uma vez que (1) libera bens e áreas geográficas, e (2) envolve as forças de ocupação (GAMBÉS) na briga. Esta forma, também, tem vantagens e limitações, e é em resposta a ambas que as pessoas estão descobrindo as possibilidades teóricas/táticas de trabalhar juntas em pequenos grupos íntimos. As perspectivas para o futuro são claras em, pelo menos, um aspecto: o Homem e sua Polícia estão aprendendo “controle de multidões” e estão intensificando sua resposta à massa de gente que toma a decisão de agir transgredindo “a lei e a ordem” desta sociedade. Nossos preparativos para fazer avançar a luta devem sempre levar em conta as habilidades e tendências do inimigo. Manifestações de massas e rebeliões em comunidades continuarão a servir para necessidades específicas em muitas situações… mas no sentido geral da luta em curso é necessário que comecemos a agir da maneira que seja mais favorável para nossos meios e nossos objetivos – PEQUENOS GRUPOS EXECUTANDO “PEQUENAS” AÇÕES EM CONJUNTO COM OUTROS PEQUENOS GRUPOS/“PEQUENAS” AÇÕES VÃO CRIAR UM CLIMA GENERALIZADO DE LUTA NO QUAL TODAS AS FORMAS DE REBELIÃO PODEM SE UNIR E FORÇAR A FORMA FINAL: REVOLUÇÃO…

Já vimos a resposta dos pequenos grupos – as Comunas de Columbia, as Gangues Revolucionárias de Berkeley, os Comitês de Ação da França, e outros que até agora só são conhecidos por suas ações (Cleveland). Nos próximos meses esses e muitos outros grupos que vão se formar encontrarão dois tipos de necessidade absoluta em sua busca por criar a possibilidade de uma comunidade real:

(1) Desenvolvimento interno e segurança. Cada grupo vai continuar a criar o seu próprio senso de identidade através da síntese consciente de teoria/prática, e cada grupo vai aplicar essa identidade à realidade existente da forma mais eficaz.

(2) Relações externas com grupos semelhantes. Temos de começar a configurar essas formas de comunicação e de conhecimento mútuo que podem permitir uma maior mobilidade e maior resposta a crises mais que locais. Isso significa que teremos de começar a criar uma rede de grupos de afinidade (tanto dentro das comunidades existentes como entre essas comunidades).

Esta rede ou “Federação” deve se caracterizar por uma flexibilidade estrutural que garanta a identidade e autodeterminação de cada grupo de afinidade, bem como uma realidade organizativa que permita o máximo de ações conjuntas dirigidas à revolução total.

O conceito de grupo de afinidade de modo algum nega a validade das ações de massas, ao contrário, esta ideia aumenta as possibilidades revolucionárias dessas ações. A minoria ativa é capaz, porque é teoricamente mais consciente e taticamente melhor preparada para acender o primeiro pavio e fazer os primeiros avanços. Mas isso é tudo. Os outros podem seguir ou não… A minoria ativa desempenha o papel de um agente de fermentação permanente, estimulando a ação sem a pretensão de ocupar um lugar de liderança no movimento social. É a espontaneidade que permite o impulso para a frente, e não as palavras de ordem e diretivas de líderes. O grupo de afinidade é fonte tanto de espontaneidade quanto de novas formas de luta.

up against the wall/MOTHERFUCKERS, no longínquo século XX.

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William Burroughs na Homocore

O zine Homocore circulou entre 1988 e 1991. Era feito por Tom Jennings e Deke Nihilson em San Francisco, e se tornou uma referência para desertoras do heterossexualismo que não se sentiam representadas pela imprensa/política LGBT liberal assimilacionista da época. Homocore foi também um dos principais cronistas da nascente cena Queercore. Esta entrevista com William Burroughs apareceu no derradeiro número do zine. 

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W.S.Burroughs foi capa do primeiro número da Homocore, mas uma entrevista com ele só apareceria no zine três anos depois.

Esta entrevista foi feita no dia de Halloween de 1990. Graças a Deusa, porque foi o único jeito de me sentir melhor por ter perdido os cuzões do Larry Lea no Civic Center. Seguindo algumas pistas excitantes, no sábado anterior eu e meu amigo David fomos até Lawrence, no Kansas, e achamos o Sr. Burroughs. Dei a ele um calhamaço de zines queers, todos os que eu tinha à mão (Chainsaw, Sister Nobody, Pavement of Surface, Faggot, JD’s e, mais oui, alguns Homocores). Ele topou ser entrevistado para a Homocore, então ao longo dos dias seguintes eu trabalhei nos preparativos com seu secretário particular, James Grauerholtz, um homem muito doce que se lembrava de mim da River City Reunion em 1987.

Seja como for, armamos tudo por telefone (eu em Kansas City, eles em Larrytown) e meus amigos pagaram a conta (aham) de todas aquelas ligações de logística, então aqui vai um obrigado adicional para a turma Sorrels/Zastoupil.

PS: Eu também falei com o Sr. Grauerholtz por uns 20 minutos ou mais, mas por uma questão de espaço mantive só a transcrição de minha (Deke) conversa com Tio Bill (WSB). O Sr. Grauerholtz foi muito lúcido e espirituoso a respeito da situação da libertação queer e da cultura “punk”/jovem. Ele foi um facilitador maravilhoso e eu faço um agradecimento especial a ele.

PPS: Burroughs e Grauerholtz amam a Homocore, mas provavelmente não tanto quanto nós os amamos! Segue a entrevista…

Deke: Tom Jennings, o editor da Homocore, e eu nos interessamos bastante por sua discussão sobre as tongs como um modelo de grupo de proteção e apoio mútuo. No entanto, este modelo parece mais adequado para profissionais com dinheiro. Você acha que as tongs poderiam funcionar sem um montão de dinheiro e no nível da rua?

WSB: Sim, eu acho que sim. Lembre-se que [aquelas às quais me referi] tinham como modelo as tongs chinesas e boa parte dos chineses era muito pobre. A ideia era que quem tinha mais dinheiro ajudaria quem não tinha.

Deke: Bom, pelo menos nos EUA, e pelo que já vi por aí, as organizações da comunidade gay costumam ser de gente tipo empresários da classe alta. Nós [Homopunks] estamos atuando muito mais na realidade das ruas. Estamos nos perguntando como as tongs podem se adaptar melhor a nossas próprias necessidades específicas.

WSB: Bom, acho que vocês podem, com certeza, se tiverem o apoio de profissionais com as mesmas ideias. Além disso, penso que algum tipo de grupos de comandos para agir contra agressores de gays é uma ideia muito boa. Isso não precisa de dinheiro, só de dedicação, como os Guardian Angels.

Deke: Tem havido alguma discussão, como na OutWeek, sobre se homossexuais devem ou não se armar…

WSB: Eu acho que devem. Há várias armas, claro [longa pausa]. Gás lacrimogênio sempre é bom. É uma boa arma e não deixa, necessariamente, cadáveres caídos. Capsdun é o melhor gás lacrimogênio.

Deke: Capsdun?

WSB: Sim, é C-A-P-S-D-U-N. Muitos lugares, ou todos, que vendem gás lacrimogênio agora vendem Capsdun. Detém o ataque de um doberman na hora.

Deke: Pra não dizer o próximo intolerante que vier correndo atrás de você na rua! Você diria que a identidade gay em si é um meio de libertação?

WSB: Bom, de certa forma, sim. Quero dizer, eu me lembro quando era mais jovem, lá pela década de 1920, tudo era varrido para debaixo do tapete. Ninguém saía do armário. Mas isso vai nas duas direções. Uma das coisas que causam a ação antigay é o fato de que eles se atrevem a fazer barulho a respeito disso. Um monte de hétero diz: “bom, tudo bem, nós já sabemos disso, mas simplesmente não queremos que seja empurrado para cima de nós, só isso”.

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Deke: Em sua experiência pessoal, qual foi o instrumento mais eficaz que você encontrou para combater a homofobia?

WSB: na verdade eu não tive muita dificuldade com isso, pessoalmente. Bom, eu sempre costumava carregar uma arma na cidade de Nova Iorque, geralmente gás lacrimogênio ou um porrete, não tanto pelos agressores de gays, mas pela violência em geral.

Deke: Você acha que pode haver uma solução política para a intolerância?

WSB: Uh, não. Eu não penso assim. Você não pode legislar um comportamento decente.

Deke: Certo. Parece que muitos intolerantes são legisladores.

WSB: Bom, é isso mesmo, esse é o problema, claro.

Deke: Você acha que isso pode ser resolvido em seus próprios termos?

WSB: Certamente isso sempre cabe aos bons, os legisladores mais liberais que podem ser eleitos. Legisladores gays também, claro.

Deke: Como já está acontecendo, em certa medida.

WSB: Isso sempre ajuda, é um passo na direção certa.

Deke: Você vê a AIDS como uma trama biológica governamental?

WSB: Bom, seu eu tivesse que apostar meu dinheiro – estou dizendo se TIVESSE que apostar meu dinheiro – eu diria que, provavelmente, isso foi deliberado. Agora o dr. Seale de Londres, um especialista em AIDS, a atribuiu aos russos. Bom, não sei o que eles teriam a ganhar eliminando homossexuais e usuários de drogas intravenosas. E, também, é um trabalho muito simples de engenharia biológica, manipulação genética, com o vírus visna, que é encontrado em ovelhas e é sempre fatal. Existe uma coisa chamada Comitê Contra a Guerra e o Fascismo, que veio a público dizer que a AIDS é uma guerra biológica do governo dos EUA contra o povo, contra os gays e os negros.

Deke: Você acha que as populações mais atingidas pela AIDS foram alvos específicos?

WSB: Bom, é o que parece. Se você pensa na origem disso como tendo sido produzida pelo homem, induzida deliberadamente, então seguramente é muito especificamente orientada. Poderia ter sido introduzida através do negócio de agulhas. A população dependente forma um duto condutor pronto para a introdução de qualquer arma biológica ou química. Ela poderia ter sido introduzida através das agulhas. Você não pode colocar vírus em algo como a heroína, porque eles vivem por um tempo muito curto fora do corpo, mas eles podem colocá-los nas agulhas. A maioria das pessoas compra suas agulhas onde compra sua heroína. É um bem estranho que ela tivesse que aparecer pela primeira vez em usuários de drogas intravenosas, que são reconhecidamente inativos sexualmente. Você dificilmente espera que uma DST comece com um segmento da população que tem uma vida sexual bastante inativa.

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W.S.Burroughs + e-meter

Deke: Você ainda escreve?

WSB: Ah, sim, sim. Tenho um livro saindo, acho que na primavera. É a versão resumida de um livro chamado Ghost Of Chance, que é sobre Madagascar e lêmures.

Deke: Oh, era isso – havia uma história na Omni.

WSB: Sim, é isso mesmo. Aquilo era um trecho. Não tenho certeza de quando a edição completa vai sair. Essa está sendo lançada pelo Whitney Museum. George Condo, um jovem artista faz as ilustrações para o meu texto. É um texto condensado do romance. Mas espero que a edição comercial seja lançada no próximo outono.

Deke: Uma coisa que eu sempre particularmente gostei em seus livros é o que pode ser descrito como o conteúdo “pornográfico”, as cenas sexuais fora do tempo e do espaço. Você pretende escrever mais daquilo?

WSB: Talvez [pausa]. Há muito pouco sexo neste livro que acabei de terminar, The Ghost of Chance. Quando você fica velho, começa a se perguntar quanto sexo tem a ver com sexo.

Deke: O que você quer dizer?

WSB: Bom, é uma questão complicada. Os verdadeiros botões que nos provocam estímulos em muitos casos não são sexuais. [Longa pausa].

Deke: Gostaria de terminar perguntando se há algo em especial que você gostaria de dizer aos garotos, garotas, garotes queer lá fora…

WSB: Sou muito militantemente a favor e com toda certeza sinto que eles devem se defender.

Deke: Você acha que ataques preventivos podem ser justificados?

WSB: Ah, sim, com certeza; o ataque é a melhor defesa em todas as ações militares. Não espere até que ataquem, já que vão atacar.

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